A novela das 23h00h, Verdades
Secretas, de Walcyr Carrasco, dividiu o público e fez muita gente dormir mais
tarde nos últimos dias. Ancorado no mundo e, sobretudo, no submundo da moda,
trouxe à tona aspectos nem tão glamourosos assim. Escancarou detalhes do backstage desse universo, jogando luz
mais para os bastidores que para as passarelas propriamente ditas. O book rosa
foi o símbolo dessa escolha temática principal, com a sobrecapa cor de rosa
encobria a degradação das modelos, que, seduzidas pelos holofotes, acabam por
cair num mundo sem cores. Arlete ao assumir sua nova identidade, Angel, faz o
rito de passagem para esse outro mundo acinzentado. A ninfeta, o mote da Lolita
é uma recorrência na literatura, vai ceder às tentações e transforma-se em
anjo-demônio.
Paralelo a esse eixo central, tivemos à mostra várias relações
humanas devastadas. A família de Alex, um tumulto constante, sem afeto, sem
comunicação, sem convivência. O pai e madrasta de Arlete-Angel, oportunistas e cruéis,
a relação de Anthony com sua mãe (excelente Eva Wilma) pautada no ressentimento,
se ampliava para a cama de Fani (Adeus, Dona Neném), entre outras. Relação bela
só mesmo a de Hilda e Oswaldo, amizade/amor maduro que renderam cenas ternas e
profundas.O triângulo amoroso sórdido entre filha-marido-mãe alimentou cenas de suspense que nos faz oscilar entre os sentimentos de repulsa, ódio e piedade. O pai se divertia com a Lolita-enteada, (inspirações incestuosas) e humilhava sua mãe (Drica, divina). Creio que as inúmeras sequências de sexo seriam dispensáveis, foram desgastando a trama e perdendo a novidade.
Houve muitos pontos altos na parte técnica. A iluminação com os jogos certeiros de luz e sombra, já que a trama expôs os recônditos humanos, aquilo que se quer esconder, mas acaba aparecendo aqui e ali. Os cenários realistas das trevas da Cracolândia e de tudo que habita naquele reino das sombras, no qual Grazi Massafera triunfou. O figurino sob medida para uma novela enredada nos novelos da moda e da sedução, como os biquínis de croché de Angel.
Voltando ao principal, a tragédia anunciada pela presença constante da arma em cena se concretizou. Angel manchou-se no sangue de sua mãe e no do seu amante, e essa nódoa-culpa a impregnou. Nelson Rodrigues ecoava em muitas cenas, revelando a vida secreta das “famílias decentes”, as verdades inconvenientes vistas pelo buraco da fechadura.
Reconheço valores na trama, mas sinceramente não me arrebatou. Penso que faltou mais ficção, mais fantasia. Entre a vida como ela é, prefiro a vida como ela poderia ser. Mais Chocolate e menos Pimenta, mais Rosas e menos Cravos, por favor, Walcyr...