A
nova novela das 18:00h que estreou esta semana já roubou nosso coração desde o
primeiro capítulo. Órfãos da Terra, da autoria de Thelma Guedes e Duca Rachid,
tem como pano de fundo histórico, para uma grande história de amor proibido, o
drama dos refugiados sírios. Parece que estes serão os dois eixos que nortearão
a trama: O amor e a guerra em suas
variadas nuances, os dois maiores temas da literatura, senão, os únicos. Com
esses ingredientes dificilmente a receita falhará. Poderia ser exibida ás 21:00h, tem força narrativa para o horário nobre.
O
aspecto verossímil da trama nos pôs dentro da Guerra da Síria, ferida exposta e
aberta do nosso tempo. A história macro da guerra cruza-se com a história micro
da família de Laila (Julia Dalavia), a protagonista da trama, difícil dizer
mocinha para uma moça tão valente. É como se em meio a milhares de vidas ali
destruídas, as autoras pinçassem uma família para individualizar o drama
coletivo daqueles que perdem tudo, até mesmo o chão debaixo dos pés. As imagens
felizes de uma festa de aniversário foram substituídas, em
segundos, por destruição e dor.
Em
meio dessa terra arrasada, cenário inóspito de um campo de refugiados, brota
(regado por água) o amor proibido de Jamil (Renato Góes) e Laila. Mas como nos
bons folhetins, trata-se de um amor proibido. O Sheik Aziz (Herson Capri
excelente no papel), vilão por excelência, já havia posto os olhos nela e, por
meio de métodos escusos, ganha o direito de desposá-la. Ao fugir para não
casar, a jovem atrai a ira do seu algoz. Não bastasse isso, ele é uma espécie
de protetor de Jamil, que o tirou do orfanato quando criança e planeja que ele seja seu genro e sucessor. Jamil, portanto, sofrerá do dilema moral de trair aquele que
o amparou, mesmo discordando de seu comportamento abjeto.
São
claro os ecos de Tristão e Isolda sobre eles. Tristão recebe a tarefa de ir
buscar a noiva de seu tio que o criara, o Rei Marcos, e, durante a missão, apaixona-se pela bela Isolda, até a viagem e o navio temos. Mas, como obra
contemporânea costurada pelos fios da intertextualidade, torceremos que o final do casal seja outro que não o do drama
medieval. Os espectadores torcem sempre por finais felizes.
Ao
escolher o tema dos refugiados como fundo histórico, enredo completamente
verossímil, as autoras também estão tratando dos imigrantes que aqui vivem
por diversas razões, na maioria por guerras também. Já sabemos que essa Babel
paulista nos trará o lado cômico da trama com tantos “brimos” e ‘brimas”
brigando e comendo quibe e tabule. Já nesse início, tivemos uma cena de briga
entre um árabe (Flávio Migliaccio) e um judeu (Osmar Prado), ressignificando
com humor conflitos milenares. Tal cena nos remeteu ao magistral filme
Concorrência Desleal, de Ettore Scola. A colônia árabe de São Paulo receberá, em
breve, a família de Laila, e o choque cultural certamente aparecerá. Do outro
lado do mapa, casamentos arranjados, poligamia, dote... Por aqui, uma prima
feminista que mostra os seios na Avenida Paulista, comerciantes tradicionais
que têm que se adaptar aos novos tempos, em meio àquele clima de casa árabe com
mesa farta, mães dramáticas e muito falatório.
Destaquemos
ainda a beleza da novela construída por riqueza de detalhes e símbolos. A
abertura é belíssima, um mosaico de vários povos que por aqui vivem e os
personagens vão se juntar a eles como naquelas fotografias de família. A oposição
entre a casa-palácio do Sheik e a pobreza dos refugiados, a aliança perdida no
meio da explosão, a chave da casa que o árabe que vive há décadas no Brasil
guarda no bolso esperando pela volta, os despojos no mar, fragmentos de vidas
que se dissolvem abruptamente e os abraços frequentes da família para quem a
Pátria passa ser apenas o desejo de permanecerem juntos, mostrando que o amor
sobrevive em meio aos destroços e é o combustível para continuar buscando uma
terra prometida...E a mola propulsora dos folhetins...
Começamos
muito bem, e com desejo aceso de continuar assistindo nossas Sherazades, Thelma
e Duca, que já nos encantaram outrora com seus cordéis encantados e joias raras,
a cada capítulo mal respiramos esperando o próximo, assim como o sultão das Mil
e uma noites, afinal o que gostamos mesmo é de ouvir boas histórias para
continuarmos vivos e esperarmos o dia seguinte....