Para Guel, Bá, Nanda e Bia
O filme Extraordinário, dirigido por Stephen Chbosky, é daqueles que nos fazem entrar em contato
com uma gama de sentimentos e sair do cinema com aquela sensação reconfortante que
viver vale a pena, ou as penas de viver valem, apesar de tudo. Adaptação do
livro homônimo escrito por R.J. Palacio, narra a história de Auggie
Pullman, um menino que nasceu com uma anomalia na face e passou por
dezenas de cirurgias, 27 exatamente. As pulseirinhas de cada internamento
aparecem como se fossem um quadro de medalhas de feitos heroicos ou troféus de
vitórias. Ele nunca foi à escola até entrar no Fundamental II (na nossa
equivalência) sendo escolarizado por sua mãe, a brilhante Julia Roberts, numa
atuação digna de Oscar. Sua mãe, seu pai e sua irmã, como é descrito no filme,
são os planetas que giram em torno do sol que é Auggie.
Chega em fim o dia tão
temido de Auggie ir à escola regular, o mote central da trama é sua adaptação a
esse novo mundo inóspito para muitas crianças, imaginem para ele que tem sua diferença
estampada na face. O que aparentemente seria mais uma história sobre bullying e
superação, ganha contornos maravilhosos que cativam a plateia do início ao fim.
Entre os pontos altos do filme está o modo narrativo que vai mostrando os
pontos de vista de cada personagem envolvido na vida de Auggie, mostrando que cada um tem suas razões para agir como age, lição de alteridade: O pai, a mãe, a
irmã, a amiga da irmã e os companheiros de escola. Detaca-se nessa estratégia o
papel da irmã e a reflexão que é feita sobre o drama de quem tem irmãos especiais
e tem que contentar-se com o papel de coadjuvante na vida da família, ela sofre
por sua invisibilidade ante os olhos da mãe e tem amparo nas lembranças do afeto
que sua avó (Sonia Braga rouba a cena em menos de 5 minutos de flashback) a
devotava e na amiga Miranda, outra grande personagem, fiquem de olho nela.
Na escola, Auggie é
recepcionado por alguns colegas que se tornam seu grupo e mais tarde descobrirá
que foi tudo a pedido do diretor, outra personagem cativante. As sequências de
rejeição e desrespeito são muitas e o menino vai sobrevivendo como pode, sempre
apoiado pelo amor incondicional da família. É sintomático o fato dele ter no
Halloween sua festa preferida, pois mascarado ele não é desprezado por ninguém
e se sente parte do grupo.
Sua inteligência e humor vai aos poucos
conquistando algumas amizades verdadeiras e vai ganhando seu espaço na escola.
São deliciosas as cenas da Feira de Ciências, ele é um geniozinho dessa área, e
da briga entre os meninos. Nessa briga é selado, de fato, um pacto entre amigos
e ele agora tem sua gangue! Sua emoção após a briga, abraçado aos meninos
diante do lago, é daquelas cenas de derreter os corações mais duros.
Outro ponto digno de nota é o
papel do professor com suas aulas cheias de ética e valores positivos, a partir
de lemas edificantes que atuam na formação do caráter das crianças. Dentre
esses lemas, há um em especial, que diz aproximadamente assim: Entre ter razão
e ser gentil, seja gentil, você nunca sabe as batalhas que o outro está
travando. Vale ressaltar também o papel das famílias na formação de seus
filhos, temos modelos diversos de famílias na trama, das modelares às
repulsivas e como isso afeta seus filhos.Ainda há um brinde especial no filme,
a relação intertextual com o universo de Star Wars e Minecraft, cerejas de um
bolo que em si já é um deleite.
O filme nos aproxima
daqueles romances de formação que o protagonista tem que passar por expiações e
aprendizagens múltiplas a fim de alcançar a felicidade. E Auggie a alcança, com
direito a medalha e discurso, como aluno destaque do colégio para a alegria da
plateia do auditório no filme e para nós na plateia do lado de fora da tela.
Vão assistir Auggie,
Augusto, sagrado, levem suas crianças (a censura é dez, mas de uns 6 em diante estão aptos) e reflitam com elas sobre o que vimos
ali. Extraordinário, aquilo que foge ao ordinário, ao comum, ao trivial e vai além...