Velho Chico nesta
última semana reuniu muitos pontos altos a serem notados no que se refere ao
poder encantatório dos símbolos. A
partir da revelação da paternidade de Miguel, tivemos uma sequência de cenas de
grande carga dramática e sofisticação de detalhes que conspiraram para
construir capítulos que entrarão para a
memória dos admiradores do gênero.
A
recepção de Miguel na casa paterna para a revelação aconteceu à mesa, num
momento de refeição com todos os membros da família dos Anjos sentados,
representação de comunhão por excelência. Fazê-lo sentar-se ali suscita a idéia de
agregação, de pertença ao clã, de amor ágape. Valendo lembrar, que as cenas da
mesa nos de Sá Ribeiro são sempre momentos de conflito, nos quais sempre alguém
se levanta ou se ausenta diante das desavenças ou destemperos do Coronel. Fica
marcado, portanto, mais uma diferença entre as casas.
Após
a revelação emocionante, pautada no belo discurso de Santo que aludiu à substituição
do lugar do seu pai Belmiro por Miguel, outro belo símbolo foi usado: o
batismo. O pai molhou a cabeça do filho, nomeando-lhe, reconhecendo-lhe. Ele
era agora um dos Anjos. Destaquemos que há também nos sobrenomes das famílias antagonistas,
Sá Ribeiro X Anjos, um pouco da história das famílias brasileiras. A primeira
guarda com pompa a tradição de serem herdeiros de uma linhagem importante a ser
perpetuada, 2 sobrenomes. A segunda, retirantes humildes, aponta para uma tradição
antiga no Brasil para descendentes de escravos, que pela ausência de sobrenomes
(documentos), a igreja costumava batizar-lhes com nomes religiosos, Santos,
Santana, Conceição, Jesus ou com o nome doa patrões, daí 1 sobrenome.
Com
a chegada do Coronel e seus jagunços no terreiro da casa, outra bela sequência.
As armas X as flores, Saruê X Piedade. O mal sendo combatido com o bem, mas esse bem é defendido com força e coragem. Além disso, o desenho do triângulo
feito no chão por Bento, Miguel e Santo, simbologia do equilíbrio das forças
dentre outras tantas possibilidades. Em seguida, os três e Lucas (felicíssimo com
a boa nova) improvisaram uma música uníssona com as mãos, selando a união de
ideais. E, golpe de mestre, Dona Piedade, personagem matriarcal magnânima, varrendo com
vigor o rastro dos invasores, que nós nordestinos sabemos bem o que significa:
- Vá para nunca mais voltar, Seu Saruê dos infernos!
A
relação telúrica das personagens também foi bem representada. Miguel, ao saber
de sua paternidade pela mãe, corre para o refúgio da natureza, inspiração de
sua vida, e remove a terra úmida, carregada de fertilidade. Já o Saruê, com sua
notada crise de identidade, se põe novamente na encruzilhada onde fez sua escolha
fatal no passado, e, embriagado, (até cantou Sentimental eu sou no Cabaré) remove a terra seca e a poeira, sinal
de aridez. Resgatado por Carlos Eduardo,
o único que deseja assumir seu legado, volta para casa para encarnar novamente
a figura externa do Coronel. Para o genro falta um componente que é tema
central da novela, o sangue, que ele começa a driblar já encarnando a
personalidade (e o chapéu) do sogro e sempre, sorrateiramente, dizendo o que o outro quer ouvir.
O que já lhe traz o mesmo conflito da personalidade partida diante do espelho.
Enfim,
foi uma semana de ápice dramático, com muitos clímaces acontecendo. A opção de
Miguel pela casa paterna trouxe para a trama uma fase de recomeço. Ainda há
muita história pela frente, e muitas outras revelações para nos emocionar. A
possibilidade que vem se insinuando sobre Bento ser o verdadeiro pai de Olívia (aquecida
ainda mais essa semana com a calma de Luzia diante da possibilidade do incesto
que desesperou tanto Santo e Tereza) e também o segredo sobre as origens de
Luzia, além da descoberta de suas malvadas artimanhas. Como disse Santo para Miguel
(agora protegido por São Miguel Arcanjo): “- Olhe para o rio, tem muita coisa
que a gente ainda não conhece.”
Continuemos
olhando para o rio, para o Velho Chico com seus segredos e símbolos. Arrepare
não e você não conseguirá alcançar a riqueza dessa novela que se esconde,
sobretudo, nos detalhes.
Excelente comentário, Alana. Apesar de não acompanhar a novela, me emocionei com o seu relato. Parabéns!
ResponderExcluirObrigada, Mary! Seja bem-vinda! E quando puder assista, é uma bela novela!
ExcluirExcelente comentário, Alana. Apesar de não acompanhar a novela, me emocionei com o seu relato. Parabéns!
ResponderExcluirBelo texto, Alana. Uma novela encantadora!!!! Sucesso!!! Grande abraço!
ResponderExcluirObrigada pela leitura, seja bem-vinda! Você também passeia pelos poderes simbólicos!
ExcluirÉ chegado o tempo da quebra do espelho. Ou melhor dizendo, dos espelhos. Afinal, são tantos os dessa trama. Descreve, com mais detalhes, a poesia ímpar da novela; e eu me deleito mais e mais e mais em suas palavras. Todavia, há ainda muitos espelhos a serem quebrados pelo clã dos Barbosa e por ti, Alana. Peço a bênção.
ResponderExcluirAbençoado seja sempre nosso olhar afiado, meu amado leitor.
ExcluirAlana, comentário perfeito. Assisto aos capítulos, aguardando sua análise. Nesta semana, ainda mais, com estas cenas , estes diálogos. Valeu !
ResponderExcluirCaríssima leitora, vc. sabe o quanto vale uma leitura crítica.
ExcluirAlana, essa semana, ao assistir a novela, pensava justamente nesses detalhes, e em como você os traria para nós. Mais uma vez, uma análise brilhante! Parabéns! P.S.: Vale sempre ressaltar: a trilha sonora é perfeita. Casa muito bem com toda a trama.
ResponderExcluirCaríssima leitora, essa semana a trama nos brindou. Penso em fazer um texto só sobre a trilha sonora que é um show diário.
ExcluirEu já tinha desanimado um pouco depois que a novela mudou de fase e perdi vários episódios, mas realmente essa semana a história começou a retomar o rumo do novelão que prometeu no começo. Você diz no início do texto sobre a ideia de agregação, eu também pensei sobre isso quando me chamou atenção um comentário que Santo fez à mesa: que a chegada de Miguel enriqueceu mais ainda a fortuna da família e a mesa finalmente (ou mais uma vez, não lembro) estava completa. As diferentes noções de riqueza, família e propriedade entre os Sá Ribeiro e os Anjos ficaram evidentes na ótima cena do confronto entre eles e ainda vai render umas boas peleias. Parabéns mais uma vez pela cuidadosa análise.
ResponderExcluirOlá, caro leitor. Sim, um dos cernes da trama são essas oposições entre os clãs, que creio que serão amenizadas por Miguel e Olívia. Continuemos atentos!
ExcluirExcelente, Alana
ResponderExcluirSempre quando passo por aqui encontro uma bela análise!
Realmente uma novela que se (re)vela nos detalhes...
Meus olhos e ouvidos ficam hipnotizados.
Abraços!
Obrigada, caríssimo aluno. Continuemos atentos e nos deleitando no curso desse rio.
ResponderExcluirInstigante, envolvente, hipnotizante... Uma conjuntura harmônica, dialógica e tocante entre fotografia, cenários, personagens, caracterização, música, trama...
ResponderExcluirConfesso que inicialmente não gostei da novela, mas a partir da segunda fase comecei a assistir e depois que vi que a minha caríssima professora fez esse blog o deleite ainda é maior. Grata por nao desperdiçar e organizar as análises antes postas no Facebook.
PS.: Litros de lágrimas durante a revelação da paternidade de Miguel.
Beijão, Profa.
Dayana Barbosa.
Obrigada, caríssima. A ideia do blog veio de sugestões sobre esse desperdício ao qual vc se refere. O Facebook não era o veículo adequado para essas nossas leituras. Continuemos em diálogo, dialógicas sempre.
ExcluirNão vou exagerar, mas você me leva a dar crédito novamente às narrativas das nove horas. Sempre com um olhar matreiro. Para além do primeiro plano.
ResponderExcluirQue honra! Volte sempre, a casa é sua! Avalio essa como acima da média, confira. Ontem mesmo, a sequência da Missa do vaqueiro e da Pega do boi foi genial. A cena da chuva chegando depois do plantio e Santo explicando os sinais da natureza.. tal e qual O mundo coberto de penas de Vidas Secas...continuemos nesse rio, porque de `ser ribeirinho vc entende!
ExcluirAlana, atualizando minhas leituras aqui no blog!Apesar de não acompanhar o enredo diariamente, paro pra ver as cenas e a linguagem teatral da novela, a fotografia cuidadosamente pensada, o Velho Chico banhando aquelas (e também as nossas) vidas. A trilha, é só começar que começo a cantarolar, pois é realmente contagiante. Obrigada por nos brindar, sempre!
ResponderExcluirObrigada pela visita. Brindemos sempre à magia dos textos, alimento de nossas vidas!
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